NÓBREGA: somente algumas questões para NATURALMENTE pensar

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  • sábado, 23 de outubro de 2010
  • por
  • Chris Galdino
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  • Quase não consegui lugar, de tão lotado estava o Teatro Santa Isabel para ver o ilustre conterrâneo, Antônio Carlos Nóbrega, apresentar: Naturamente- teoria e jogo de uma dança brasileira. Felizmente, do espaço que consegui na torrinha (graças a assessoria e coordenação do 15º Festival Internacional de Dança do Recife, pois os ingressos estavam esgotados) via-se perfeitamente as cenas, com o privilégio de poder enxergar os desenhos de luzes projetados no chão do palco. Já para ouvir, tive que fazer um esforço, porque os espectadores da minha fileira de cadeiras, falavam durante todo o espetáculo . Bem, com bastante esforço ouvi as explicações do carismático e talentoso Nóbrega sobre dança e música no contexto nacional e a pesquisa por ele realizada in loco nos quatro cantos do país, já previamente apresentadas em um vídeo muito bem editado, que mostra extratos desta valiosa pesquisa nas danças brasileiras.

    Ao contrário da simpatia do mestre de cerimônias, o já tão explorado formato aula-espetáculo, escolhido por ele, me causa em geral antipatia. Mas, é claro, isso é minha opinião. E explicoa razão: a dança enquanto obra de arte, para mim, não deveria precisar de explicações, de uma bula ou manual para se fazer entender. Além do mais, acredito que nas experiências artísticas é o nível sensorial e o emocional que operam, a racionalização ou a didática do processo tornam-se desnecessárias quando a obra consegue a “co-moção” do seu público por estes canais. Talvez se ele tivesse construído um espetáculo de dança, inclusive com um elenco maior, informasse muito mais sobre a dança brasileira que ele se propõe construir a partir do cruzamento e entrelaçamento das danças de matrizes populares. Como acontece com o Balé Popular do Recife (que a partir de uma pesquisa nas danças do Nordeste e, principalmente, de Pernambuco criou e difundiu sua metodologia Brasílica), e seus descendentes diretos e indiretos, que há mais de 30 anos desenvolvem e apresentam essa linguagem híbrida nos tantos espetáculos do que aqui em Pernambuco se convencionou chamar de dança popular cênica, e nas experiências de fusão com outras técnicas de dança, como é o caso da pesquisa em dança contemporânea desenvolvida em São Paulo há mais de dez anos, por Ângelo Madureira e Ana Catarina Vieira. Ou ainda como faz Maria Paula Costa Rêgo, confessa defensora da estética Armorial, combinando com maestria elementos populares e eruditos na dança do seu Grupo Grial.
    Com músicos e bailarinas de uma excelência ímpar, Nóbrega, consegue esboçar um vocabulário de dança, mas ainda carecendo de maior pesquisa corporal de todos os envolvidos (criadores e intérpretes) e muito mais vocábulos para se estabelecer enquanto linguagem. As "posições-base e posições torções" apresentadas como elementos de composição deste dançar, aparecem em cena demasiadamente (como se precisassem de mais letras mesmo para escrever a partitura de movimentos) nas demonstrações dele próprio e na atuação primorosa de Maria Eugênia Almeida e Marina Abib, mas falta explorar melhor, ou talvez incorporar melhor a espontaneidade e a energia, que Nóbrega mesmo chama de "temperamento" das danças brasileiras. Vê-se também (ou ainda), traços fortes da técnica do balé clássico europeu nos corpos das duas bailarinas. O que me deixou uma dúvida: na metodologia ensinada ao vivo na sua aula-espetáculo, Nóbrega remete-se apenas ao repertório da cultura popular, mas será que está subeentendido um cruzamento com as ditas técnicas clássicas de dança? Também senti falta de uma explicação (já que o formato abria espaço para isso) sobre a presença de dois personagens do seu espetáculo Figural, interpretados por ele, em Naturalmente. De que maneira, eles participam da teoria e jogo de uma dança brasileira ou são seus modelos, seus representantes?
    Naturalmente, aponta um caminho possível a ser percorrido na busca já antiga (Ou não era esse um dos objetivos do já quarentão Movimento Armorial, do qual Nóbrega fez parte?) de formar uma expressão artística e, no caso, uma dança nacional, baseada nas matrizes populares. Mas esta é apenas uma das vias e outras tantas têm sido experimentadas, nomeadamente, por grupos pernambucanos, que ainda não têm o reconhecimento e a visibilidade de Nóbrega. Creio, sinceramente, no plural como expressão desta brasilidade, e na diversidade como forma. As danças brasileiras existem e estão se fazendo a cada dia. A proposta por Nóbrega é apenas “uma” destas iniciativas, o que não invalida nem desvaloriza as tantas outras. Fiquei com vontade de ver esta dança brasileira por ele teorizada acontecer mais nos corpos em cena (ser mais vivenciada e menos demonstrada) e tomara que sua pesquisa continue para colhermos bons frutos em um breve futuro.



    Crédito: Victot Jucá

    PS Alguém podia explicar ao senhor que estava do meu lado narrando todas as cenas, acrescidas ainda dos seus comentários pessoais sobre cada segundinho da encenação, que isso que ele fez é tão falta de educação quanto fotografar os espetáculos com flash.

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